quinta-feira, 13 de maio de 2010

Pêlos vistos... temos Blog!


No vasto negrume que invasivamente tende a apropriar-se do azul do céu deste cantinho à beira mar despencado, na berrante insanidade que se apropria das nossas vidas, dos nossos bolsos, das nossas mochilas e carteiras, no obscuro limiar civilizacional que, ironicamente, parece deixar entrever apenas como paisagem disponível uma espiral infinita de brumosa letargia, sento-me no meu banco meditativo, exaurida. Concordo com as minhas compinchas, que há que criar um blog e partilhar convosco toda esta perturbadora aventura de existirmos em crise. Oh, mas não é crítica toda a História do Ser??...Bom. Sim, um blog. Temos de estar juntos, é necessário estarmos próximos. Novos amigos, futuros melhores amigos, olá. Que bons voos façam connosco acima deste ninho, e que se esboce aqui, no recato deste espaço pensante, a panaceia para os males da Nação, e direi mais, do Cosmos!

Na treva sombria de todos os inumeráveis males que podemos disciplinadamente contabilizar, ocorre-me um que não será, por certo, dos menores. Foi há muito pouco tempo que, confesso, tomei contacto com esta realidade que muitos e, sobretudo, muitas de Vós tão bem conhecerão. Mas eu ignorava. E, como todos os ignorantes, era dona de uma Felicidade intocada e cuja mutação foi, desde o momento definitivo a que me refiro, irreversível. Sei que anseiam detalhes. E a mim cabe-me detalhar com (des)gosto. O que se passou foi o seguinte:

O Verão aproxima-se a passos largos, como é sabido, apesar das birrinhas intermitentes da nossa dilecta Prima Veríssima. Como um todo vivo e em mudança, o nosso organismo segrega, incha, desincha, estala, move-se, lava-se, tolhe-se, as unhas cortam-se, algumas borbulhas tomam, faceiras, o cândido território da nossa cútis, as remelas espreitam pelas manhãs e ….os pêlos crescem. Lembrei-me então (Oh ledo, amargo engano), de adquirir uns boioezinhos de cera, dita tépida, a fim de me lançar, numa timidez virginal e iniciática, nos meandros da depilação rigorosa, sofisticada, duradoura, senhoril. Sim, senhoril, uma instalação confortável nos meandros femininos, com a suave confiança de que os meus pêlos seriam admoestados, e de que todo um novo universo, na verdade um pluriverso de revelações e sensações se abriria para mim. Preparativos semi-extasiados entre a cozinha e a casa de banho, boião no microondas, leitura académica das instruções. Meta o pauzinho e rode que se estiver quente há-de aparecer “NO!” Hum. Foi bem verdade. Quente qb, fui dando à espatulazinha para controlar a temperatura do milagroso preparado. Mas então nunca mais? Claro que, sendo curta, a espátula rapidamente se encheu de cera e, por arrastamento, também os meus dedos. Dedos bezuntados, pauzinho lentificado na espessura febril da cera, toda a inenarrável nhanha a conquistar polegadas sucessivas do boião, do móvel, do chão, os dedos colados à espátula, escarranchados na caixinha, colados entre si como se devorados por um Pega-Monstro feroz, e o desconforto a subir dos pés à cabeça. A apelar à calma e a uma réstea de concentração, lá testei a temperatura da misturaça com a pontinha do mindinho. Nada do “NO” se transformar em “Yes” ou, pelo menos, desaparecer. Mas que importava? Parecia já morna aquela massa informe cor de mel. E até levemente perfumada. Ora, há que ter alguma perseverança no meio destas situações quotidianas, nem tudo é fácil na vida…Proceda-se à aplicação, esperando que a temperatura não me aumentasse ainda mais os derrames já existentes. Recomendada uma camada bem fininha de cera sobre as perninhas, lá iniciei, com a sensualidade de um escultor a intimizar-se com o seu cinzel, todo o processo de espalhar a cera com a espátula, naturalmente (eh bien, não haja equívocos) no sentido do crescimento do pêlo. Tentei, não sem algum estoicismo, arredar a vozinha cretina que me soprava, sibilina… “Com tanta cola junta, há-de ser no sentido contrário, no mesmíssimo sentido, e até a pique que essa m…iscelânea se há-de para aí alapar”. Espalhei, apus a reconfortante faixa branquinha, pressionei com a firmeza e a audácia dos crentes. Ai que medo, isto deve doer tanto!, arrisquei pensar. Respirar fundo….Deditos preparados no final da faixa…Depois da tempestade vem a bonança, o que arde cura o que aperta segura, não há mal que nunca se acabe…Enfim, toda uma sucessão de verdades intemporais ecoava sem cessar, numa tentativa de encorajamento realmente comovedora. E….zássssssssssssssssssssssssssssssssssssssss! Não doeu quase nada, a bem da verdade. Também a bem da mesma verdade, vi realmente manchas isentas de pilosidade e vários oásis de pêlos resistentes entre as ditas. Nada de desiludir. Nova aposição das faixa…Nem consigo imaginar se, no meio das repetições da pegajice sobre a pele mais algum pêlo saiu, se tudo era já uma ilusão de óptica auxiliada pela sujeira da cera e das faixas amarrotadas. Ok, fiquemos pela meia perna. Isto com o tempo e com a experiência vai lá, e só tenho de emendar o resultado com gillete. Onde deve mesmo valer a pena é nas axilas e nas virilhas. E a este passo, posso dizer, a minha mundividência conheceu uma transformação efectiva. Cera colocada, banda necessariamente toda torta a procurar abranger as sinuosidades e concavidades axilares…Respirar fundo, muito fundo e…..zásssssssssssssssssssssssssss. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Olho: picos de sangue em vários sítios da axila, e uma dor…Uma dooooooooooor! O arranque inicial e o desconforto subsequente…Engoli em seco, mudei de cor, aferi do resultado: manchas de pêlos e manchas branquíssimas, limpas, lindas. Completamente descoroçoada e já desprovida da totalidade de equilíbrio emocional, passei à axila seguinte, porque neste caso era essencial passar por esta provação em par. Combalida, dorida, revoltada e tomada de uma ira à beira da perigosidade máxima, agarrei-me às bandas usadas e às bandas sobejantes, à caixinha e à espátula e enfiei tudo num saco de plástico definitivo, num horror definitivo: fora! É para isto? Para os pêlos não saírem, para me aleijar estupidamente, para encontrar este desapontamento no fim da linha, para um gasto imponderado de dinheiro que tanto custa a ganhar? Antes peluda, antes felpuda, antes rapar-me, raspar-me diariamente! E nunca as gilletes me pareceram tão modernas, tão poderosas, tão simpáticas e macias. Desculpem mas, depois desta experiência, uma pessoa não pode ser igual.

Meditabunda

3 comentários:

  1. Devo esclarecer todos quantos lerem este blog, que nada deste relato é falso. Muito pelo contrário.

    Posso jurar que foi bem pior.

    Felizmente não assisti a esse espectáculo deplorável. Tenho a certeza que deve ter sido uma coisa medonha.

    A Meditabunda é completamente alucinada.

    Avalanche

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  2. Meditabunda, áquela que desgraiça te metestesss nese aventure de pelos. eh cái cruava o mivimente dos sem peles. aqile arranque tuido.. é muite pregiuso e as melheres nã saibem, ai que nervoiso isse tuido quela cu me curaçãe bate.. tui toma cuidade e nã te coretes. Cimprimentos peludos, Madaluqueira.

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  3. Hum, começo a entendê-la com um pouco menos de dificuldade e rugas na testa Menina Madaluqueira...Sim, sim, é perigoso e digo mais, ardiloso, muito ardiloso! A pessoa ainda se esfola para ficar sem pêlos...não sei que faça. Obrigada pela solidariedade.

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