domingo, 19 de setembro de 2010

O Insustentável Brilho do Ser



Hoje...Amigos e amigas, miríades de leitores e, sim, Mundo em geral: leiam, ouçam os tambores, os trombones, o canto dos passarinhos mais exóticos.

Uma cobrazinha cuscavel pequenina abria as suas sagazes pálpebrazinhas, pronta a dardejar sobre o universo os seus raios de solar clarividência e cândida amizade. Graciosa e afoita libelinha, belíssima e magnífica Annapurna (com lots of ice, please!!!).

Que dizer de uma das nossas mais válidas razões para nos lembrarmos que existir vale a pena? O que acrescentar sobre uma irmã, pois o que o sangue não deu a vida e o amor juntaram e tornaram eterno? Como ampará-la, antes que desmaie de exaspero ao ler estas "mal traçadas" linhas???...

Apenas saudar este dia, saudá-la todos os dias, agradecer-lhe pela sua doce e afável bruteza, pelas infinitas estalactites de humor-agulha, pela companhia totalmente prazenteira que nos concede entre os seus incontáveis devaneios e as suas loucuras indizíveis mas sempre saneadoras.

Salve Cobra Cuscavel!!!

Mil beijinhos-voadores das cuscas Avalanche e Meditabunda

sábado, 24 de julho de 2010

Avassaladoramente Avalanche


Salve, salve, salve!

Todos os fogos de artifício estalam, todas as estrelas gargalham, todos os sóis se levantam a abraçar o Planeta, embevecidos por ela!

Salve, salve, salve!

Todos os aviões voam a celebrá-la nos ares e nos céus mais distantes!

Salve, salve, salve!

E nós estalamos tanto, gargalhamos tanto, abraçamos tanto, celebramos tanto, nós voamos tanto com ela e por ela por ela por ela.

Salve, salve, salve, eis a Bela!

Meditabunda

Há avalanches que vêm por bem!


Há forças da natureza que não podem ser contidas, que abrem caminhos e arrastam tudo e todos à sua passagem. A sua beleza reside na sua imprevisibilidade e na sua força. São arrebatadoras, avassaladoras, indomáveis!

Se for apanhada no meio de uma avalanche aproveite a boleia. Não resista e siga a corrente. Se acabar de pernas para o ar, considere que tem agora uma perspectiva única da vida.

Cobra Cuscavel

domingo, 27 de junho de 2010

Margem


Queria ver-me sentada à margem de um rio. Contemplativa das águas e dos seus mistérios cristalinos, verdes, incolores, aspirante dos seus segredos fugidios, sobre o rio reclinada e pensante. Pacificar-me (d)entre as flores sem idade e inspirar com delícia os ares perfeitos do campo. Saber do bosque ali perto e do espaço fresco, líquido, rente à pupila.

Ansiava e com viva pena anseio sentir-me livremente encapsulada no Paraíso terreno possível e tão vasto das coisas amadas e das coisas que amam mesmo sem o saberem por serem, afinal, coisas: caso da árvore, da pétala perfumada da rosa e do rio. Caso, em particular, dos nossos queridos próximos. Dos nossos. Como seria maravilhosamente bom podermos, nós e esses, viver perto dessa visionada margem.

Este sítio onde estou, cheio de alcatrão, carros e ferro e outros, é longe de onde almejo. Íntimo, irmão do meu almejar é, entretanto, apartado do que tanto queria. Essa distância é enorme; ácida e fatídica para o meu sonho.

* Fotografia de Meditabunda



Meditabunda

sábado, 5 de junho de 2010

Gay ou Gatuno?


Eleições na Great Britain! Fora com os Trabalhistas e novo governo de coligação entre Conservadores e Liberais Democratas. A crise é mundial, o “British Way of Life” está periclitante, impõe-se rigor e contenção nas contas públicas e, por isso, começa a demanda do Homem que irá salvar as preciosas librinhas esterlinas inglesas!

E é aqui que surge o nosso super-herói – o Sr. David Laws, 44 anos, advogado, banqueiro e milionário. Com tantos predicados, quem melhor para Secretário-Geral do Tesouro da velha Albion? Tudo parecia bem encaminhado, o povo respira de alívio quando, em 3 semanas, rebenta um escândalo que cai que nem um pedaço de “kryptonite” sobre a fleuma britânica.

O Sr. Laws é “gay”! Oohhhh! O Sr. Laws entre 2001 e 2009 alugou um quarto na casa do seu namorado, cuja renda debitava ao Parlamento, ou seja, pagava o seu ninho de amor com dinheirinho dos contribuintes! Aahh…, o quê? Como?

Então foi assim:

Como representante de Yeovil no Parlamento Britânico, o Sr. Laws tinha direito ao pagamento de alojamento em Londres. Nesta conformidade, o Sr. Laws pensou ser útil (e agradável, imagino) arrendar um quartinho na casa do namorado. Ficava, assim mais perto de tudo, da Câmara dos Comuns e do amor da sua vida. E se melhor pensou, melhor o fez.

Mas, para grande espanto do nosso herói das leis e finanças, em 2006 as regras do Parlamento mudam e passa a ser ilegal apresentar despesas de arrendamento em casas de familiares, especialmente, casas de “companheiros”, definidos como membros de um casal que mesmo não sendo casados um com o outro, vivam juntos e se tratem entre si como esposos.

Esta alteraçãozinha nas regras deixar-me-ia imediatamente de sobreaviso. Mesmo não sendo advogada ou economista, imaginaria logo que visava acabar com uma série de abusos que por ali iam mas, o nosso super-habilitado herói, depois de analisar o assunto, conclui que a coisa não se lhe aplica. Vive com o namorado mas dormem em “quartos” separados, têm contas bancárias separadas, levam vidas separadas, não se tratam como esposos… logo não são um casal! São qualquer coisa completamente diferente e que ainda não foi expressa por palavras de inglês corrente.

Pois! Seria uma maneira de interpretar a coisa se fossemos todos burros ou inocentes. Como não somos, a dedução está errada! Como também está muito mal amanhada a justificação do Sr. Laws de que nunca pretendeu lucrar com a situação mas apenas esconder a sua orientação sexual.

Por favor! Agora já se usa a homossexualidade para se esconder o facto de que se é desonesto? Claro que este senhor, e todos os outros visados pela alteração normativa, apenas queriam fazer um jeitinho aos companheiros/familiares, assegurar-lhes um rendimentozinho extra. E é por isso que agora o Sr. Laws vai ter de devolver os cerca de €48.000,00 recebidos indevidamente. É muito bem feita! O Sr. Laws que tenha vergonha, não de ser gay, mas de ser gatuno, ladrão, larápio, vigarista!

God save the Queen, the Britains and all of us!


Cobra Cuscavel

quarta-feira, 19 de maio de 2010

E Tudo a Canícula Traz



Não sei se por acaso concordarão mas hoje abateu-se mais um dia de calor, aliás, de braseiro, absolutamente inverosímil. Convenhamos, estamos apenas em Maio…pouco passámos dos meados de Maio, e este bafo fervente ilude completamente o calendário. Parecemos ter despencado em Agosto, logo depois de uns dias fresquinhos e até pingados de la bonne pluie. Buf. Sim, nem mais, bufar foi o que fiz várias vezes, passe-se a inestética do acto. Mas que quente, e a sudorese, o congestionamento facial, o drama, o horror, a canícula!

Nos meus tempos mais juvenis, como eu simplesmente amava as altíssimas temperaturas! Nos últimos anos, porém, tenho nostalgia das amenidades das meias-estações suaves, do frescor dos dias outonais ou de princípio de Inverno. Mesmo nas indumentárias, tudo é tão mais charmant, composto, bonito na estação fria. Como é bom poder adicionar sempre mais um cachecol, uma écharpe, um chapéu! Num dia como o de hoje, apenas essa menção me remete de imediato para o domínio da fábula.

Garanto-vos, sublimes leitores: as pessoas até são mais sossegadas, mais ordeiras, à medida que as temperaturas se domesticam abaixo dos 18 graus. E os cafés? O Majestic, por exemplo, da nossa querida cidade Invicta, fica incomparavelmente mais recatado e encantador no Inverno, fechadinho e pensativo, filosófico mesmo, do que alargando-se para a rua em esplanada, já por certo em incessante algaraviada.

Claro que a consequência desta violência meteorológica também encontra eminente expressão nas calorias consumidas: só nos últimos dois dias esta que dedicadamente vos escreve ingurgitou seis gelados. S-E-I-S. Mas onde é que isto vai parar, onde? Ninguém sabe (remate soturno-fatídico).

Enfim, venha alguma compensação: andamos mais mal vestidos (e até híbridos, com vestuário de todas as estações à mistura) e cansadotes, a celulite já dói mas, por outro lado, fazemo-nos acompanhar de um bom Corneto a derreter para tudo quanto é lado. É justo, justíssimo!

Meditabunda

*Imagem: Will Cotton, Ice Cream Cavern

terça-feira, 18 de maio de 2010

Vacina Contra a Crise



O Diário de Notícias publicou uma nova proposta do Bloco de Esquerda (BE): - poupar 7 milhões de euros ao Estado através da distribuição gratuita da vacina da gripe sazonal a idosos.

As contas são fáceis e claras. O Estado gasta cerca de 5,5 milhões com a comparticipação de 37% da vacina da gripe. Se esta passasse a ser gratuita para os idosos gastaria mais 3,4 milhões. Contudo, este gasto seria compensado pelo aumento de pessoas protegidas contra a gripe e pela diminuição dos custos com internamentos. Salienta-se que todos os anos são internadas cerca de 30 mil pessoas devido a complicações por causa de gripe e pneumonia, e cada internamento custa em média entre 3100 e 4200 euros. Assim, segundo as contas do BE, aumentar a cobertura da vacinação contra a gripe de 50% para 75% nos idosos vai evitar quase 2900 internamentos e, consequentemente, permitir poupar 10,5 milhões. Se descontarmos os 3,4 milhões gastos a mais com vacinas, a poupança fica nos sete milhões.

Não é maravilhoso?! Às vezes é dos bolsos que saem os melhores sentimentos! Salvam-se os velhinhos e reduz-se a despesa pública. São dois coelhos de uma vacina só! Mas infelizmente nem todos estão de acordo com esta medida e adivinham-se grandes discussões até ao próximo Inverno.

Para verem o enviesamento da argumentação, o DN reporta-nos que a deputada socialista Maria Antónia Almeida Santos é contra a medida porque acha que se devem ‘evitar projectos populistas que não têm por base fundamentação científica’ e ‘prometer tudo a todos não é o melhor caminho’. Até parece que o referido partido não chegou ao poder com promessas de não aumentar os impostos e depois deu o dito por não dito, justificando que desconhecia o verdadeiro estado das finanças portuguesas. Não houve tempo para os tais ‘estudos’ durante a campanha eleitoral, não foi?

Também Clara Carneiro, do PSD, diz que o seu partido não é favorável porque o ‘grupo alvo é muito específico e a vacina também’. Entenda-se, então é tudo para os velhinhos e nós não abichamos nada?

Por fim, a Direcção-Geral de Saúde salienta não haver dúvidas de que a vacina da gripe é vantajosa para os grupos de risco, mas que nenhuma vacina é introduzida no Plano Nacional de Vacinação sem estudos exaustivos ‘que provem inequivocamente o seu impacto" na saúde pública e nos custos’. Ou seja, ainda temos de falar com a Segurança Social e verificar se a poupança anual em pensões com os que morrem de complicações da gripe é maior ou menor que a eventual poupança nos internamentos hospitalares. Sabemos lá quantos mais anos estes velhinhos ainda poderão viver quando estiverem com a pica toda! Ahh???

É uma pena, de facto, ver as questões de saúde entregues a engenheiros e a protecção social a advogados do Diabo…

Cobra Cuscavel

segunda-feira, 17 de maio de 2010

O presidente à beira de um ataque de nervos


Cavaco Silva apareceu perante as câmaras da televisão, há uma hora atrás, mais enrugado, amarelo e magro que nunca. Já vi pessoas com menos de um mês de esperança de vida, com muito melhor aspecto e cores. Cheguei a temer o pior.

Mas não. Aquela tez seráfica em tons amarelo acinzentado, teve como motivo o ver-se obrigado a fazer algo que não queria. A contrariedade, irritação, o mal-estar, era visível na secura da boca e até nas mechas de cabelo mais brancas que habitualmente.
O homem deve ter envelhecido anos com esta história toda.

Ainda andou para ali às voltas mas por fim lá disse que como o parlamento ia voltar a votar a favor, ele não tinha outro remédio que promulgar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Diz ele que este é um tema que divide o país. Pensava eu que era uma forma de unir as pessoas.

Agora malta, nada de se encherem de pruridos e não quererem ir assinar o papelinho. Afinal de contas, tanta manifestação e abaixo assinado se fez, agora é hora de mostrar que valeu a pena.

A partir de agora a luta será a de honrar o compromisso que cada um venha a assumir com outro igual. Porque, de tanto que foi pedido, quero crer que assinar um papel faça diferença.

Avalanche

Beldades de alto nível


Na passada sexta-feira passada, entretinha o meu tempo entre a casa e o trabalho a ler alguns jornais de distribuição gratuita, quando tropecei na secção ‘Relax’ do ‘Global’. Duas páginas de anúncios cor-de-rosa pequeninos (227 contadinhos), ilustrados com fotos de mamas e bundas generosas, sublinhadas aqui e ali com vestígios de roupa íntima de gosto algo duvidoso (no meu entender, claro está!).

Cansada das notícias sobre a crise e sobre a visita do Papa ocorreu-me, pois, dar uma vista de olhos mais atenta à evolução do mercado sexual português. Afinal sou uma ‘amadora’ nestas questões e, se quero estar a par das últimas tendências, devo acompanhar de perto o trabalho das ‘profissionais’ do ramo.

Um anúncio, em particular, despertou a minha atenção: - “Sr. Executivo, venho por este meio informar estarmos disponíveis p/ 1 convívio c/ maior discrição. Aguardamos retorno.”

Mas o que é isto? Um requerimento? Fiquei confusa, afinal o texto indicia uma alfabetização mais sofisticada que a 4ª classe. Decidi investigar mais profundamente o caso. Li e reli todos os anúncios e inventariei os atributos mais cotados nesta bolsa de valores femininos.

À primeira vista nada tinha mudado, mantendo-se a procura ávida de louras esculturais, com peitos XXL e bumbuns gulosos. Sexys, atrevidas, desinibidas, ardentes na cama, com perfeito conhecimento de todas as letras e números da cartilha sexual (O. gulosos, A. profundos, 69 escaldantes).

Contudo, toda uma nova gama de sofisticados predicados emerge, dominando a oferta. As ‘bonecas’ louras, peitudas e rabudas, agora também são elegantes, charmosas e cultas, têm formação universitária, dominam línguas estrangeiras, fazem massagens de índole terapêutica e erótica e, pasme-se, são ainda muito meigas, doces, pacientes e carinhosas. Enfim, são, como se diz na ‘gíria profissional’, ‘completíssimas’, amantes, amigas, companheiras, ou seja, umas senhoras, verdadeiras ‘damas na mesa e na cama’.

Mas, então, para que é que servem as putas? Para pinar ou para levar ao almoço de Natal da empresa? Então não era apenas sexo, sem significado? Temo que andemos a ser enganadas em mais do que um sentido. É que para comentar as notícias do dia, ouvir desabafos, trocar beijos e ser muito compreensiva e meiga na cama qualquer namorada ou esposa serve. E só não é loura e mamalhuda quem não quiser (o que mais há por aí é tinta e silicone).

Que concluir, então, sobre os homens que, tendo o produto legítimo em casa e de borla, fazem questão de pagar a estranhas para, além dos orgasmos, fingirem amor e romance?

Que são uns rematados imbecis, tão ridículos e patéticos que não sei se me ria ou se chore.

Cobra Cuscavel

sábado, 15 de maio de 2010

Por que é que fazemos blogs?


Andava eu a cogitar de um lado para o outro da mansarda desta minha extenuada mente quando me ocorreu pesquisar quantos blogs existem. Não cheguei a uma conclusão, diria, actualíssima. Porém, rezam os entendidos nestas matérias que, em 2007, ascendiam ao robusto número de 112 milhões, e parece que 175 mil novos vêm a luz dos screens diariamente. Milhões de blogs, milhões de bloggers, milhões de posts, de planos, de sonhos, de fotos, de factos, de links e de imaginários à solt@. Por quê?

Claro que as pessoas podem invocar o seu grande gosto pela escrita, a oportunidade de expor ideias, poemas de verdadeiros poetas e poetastros, recordações, teorias, receitas de culinária, revoluções, bricolage. Concordo que exista inevitavelmente um amor ou um affaire com a pena, leia-se, com as teclas, e uma vontade de mostrar alguma coisa a que se vota tempo e dedicação. Ou, até, a criancice que raia a ternura de verem em letra de imprensa, a pontuar o écran, qual televisão, os seus escritos, uma parte de si. Quem sabe, um secreto desejo de que os textos se possam transmutar, um dia mais tarde, em papel, em romances publicados, em artigos disputados pelas revistas da vez. Noutros espíritos, e reconditamente, um soslaio ao “estrelato”, uma perspectiva de reconhecimento público, um convite para apresentar a 547ª edição da Operação Triunfo.

Pode ser isso tudo. Mas eu, Meditabunda, tenho para mim que, a perpassar todos estes movimentos de esperanças e ansiedades, labores e antevisões, vive uma íntima vontade e uma genuína necessidade de nos tocarmos uns aos outros como quem pensa em conjunto, de pensarmos como quem se toca. Alguma coisa do cidadão comum para o cidadão comum, sinais de fogo entre semelhantes. Porque alguns motoristas de autocarros podem ser rudes, alguns médicos insuportáveis, pode haver cabeleireiras azeiteiras, ou senhoras que com as suas fisionomias antipáticas e altivas e confusas encham as ruas, peões alucinados, ciclistas alucinantes pelos passeios a incomodar transeuntes sorumbáticos. Existem certamente colegas de trabalho que odiar não odiamos porque somos grandes de artéria aorta, mas os quais desprezamos profunda e até estrepitosamente, e chefes que acordam o mais intrépido dos bombistas suicidas dentro de nós, camuflado sob um manto de discrição e aparente saúde (ahahahahah, riso histérico!), e públicos que nos maceram tão meticulosamente que ousaríamos pensar-nos incapazes de refazer os nossos múltiplos pedaços triturados para ressuscitarmos o esqueleto vivo que há em nós. Porque é certo que as ingratidões de amigos e as mágoas de amores, bem como a fome na Etiópia e as guerras afegãs nos fazem zangar e desejar ardentemente evitar a Humanidade, até porque a finitude nos entristece deveras, de perto e à distância. Pode ser tudo isso.

Mas em todo este grotesco desconforto dos dias, e são muitos os desconfortos e muitos os dias, carregamos comovedoramente, nos nossos corações ainda mordidos por alguma avidez muito jovem e muito futurista, um desejo de falarmos uns com os outros, a velha fantasia de ficarmos à conversa, ainda que fugaz, com o anónimo em cuja inesperada companhia fazemos uma viagem de comboio ou de calçada, a perpétua impressão de, como diziam os antigos, termos sido todos um numa inlocalizável anterioridade. O mitigar de solidões, o chegar a nós através dos outros, o sermos com outros em nós. Somos milhões e milhões de solidões acompanhadas neste grande mar. Os blogs são milhões de barquinhos e jangadas, as novas caravelas cujo destino não são já geografias, mas o mistério sem tempo da curiosidade e estranheza e apego e saudade que temos uns dos outros, mesmo desses outros a quem ainda não vimos, a quem sequer conhecemos, a quem nunca viremos a encontrar.

E há uma efectiva beleza nisso.

Meditabunda

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Um dia destes falamos da crise



Dou as boas vindas aos novos amigos e sobretudo aos inimigos que se quiserem juntar a nós neste blog de gente amalucada mas que pensa pelos cotovelos.
Digam, critiquem, escrevam, opinem, sintam-se como se estivessem no vosso blog.
E aqui vou eu, hoje a transbordar de ódio e descrença, debitar as minhas primeiras linhas.

Um dia destes falamos da crise

Primeiro o escandalo do túnel, depois o castigo da liga, mais tarde o vencedor do campeonato, três dias depois a convocatória para o mundiaL, agora a visita do papa, daqui a uns dias as três semanas em directo da África do Sul que vão parar o país.
Não é que o país alguma vez tenha andado. Aliás, tem andado sim, mas para trás.
Os alunos batem nos professores, os postos de saúde fecham e somos atendidos em Espanha, os impostos aumentam, as ameças ao subsídio de Natal pairam no ar, o poder de compra dimínui. Quem me disser que isto não é andar para trás, que atire a primeira pedra.

Num dia como o de hoje em que pela presença do papa se fala tanto de amor, como se ele tivesse alguma coisa a ver com tão sublime sentimento, há pessoas que deixaram de ser operadas nos hospitais públicos, tudo por que o “des”governo deu o dia, em favor da oração, meditação e redenção pública.

Sabemos muito bem que estas horas supostamente dedicadas à fé, dizem eles que é à fé, eu chamo-lhe outra coisa, foram para ir às compras, à feira do livro, almoçar fora e sobretudo fazer uma ponte de quatro dias. Não há inferno que chegue para tanta canalhice.

E por falar em canalhas, assim remato a minha crónica de hoje: Políticos* e mais gente desonesta, não fosse eu estar desconfiada que vocês gostam muito e mandava que todos vocês fossem levar no cu. De preferência de um africano regiamente abençoado e vigoroso que vos empalasse até à alma.

*Obviamente aqui está incluída toda a escumalha que nos rouba descaradamente. Dar tréguas a esses ladrões? Jamais!!!!

Avalanche

Portugal vs Grécia


Em Fevereiro último, a então Presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite, afirmava que Portugal estava rigorosamente no mesmo caminho da Grécia e que, se nada se fizesse, em dois anos poderia ficar em situação idêntica ou pior.

Não faltaram de imediato as vozes indignadas. Que não, que não era nada assim, que somos muito diferentes. Jorge Lacão, ministro dos Assuntos Parlamentares exige retratação. O Presidente da Republica, Aníbal Cavaco Silva, afirma que houve má fé na comparação, até porque não há qualquer comparação entre ambos os países. Durão Barroso, Presidente da Comissão Europeia, defende que Portugal apenas tem de se preocupar em levar o PEC por diante. E, para terminar com a polémica, Jean-Claude Trichet, Presidente do Banco Central Europeu declara que Portugal e Grécia não estão no mesmo barco.

Passados nem 3 meses (a Manuela aqui errou feio) e já estamos a discutir o aumento de impostos, cortes nos subsídios de Natal e Férias, reduções salariais e outros ‘sacrifícios’ pelo bem da Nação. Bom, se a doença é diferente o remédio é o mesmo. Se seguimos em barcos diferentes (uns no Titanic e o outros no Lusitânia) rumamos todos ao fundo.

A verdade meus caros cuscos e curiosos, é que nos vamos todos ver gregos para pagar esta crise!

Cobra Cuscavel

Pêlos vistos... temos Blog!


No vasto negrume que invasivamente tende a apropriar-se do azul do céu deste cantinho à beira mar despencado, na berrante insanidade que se apropria das nossas vidas, dos nossos bolsos, das nossas mochilas e carteiras, no obscuro limiar civilizacional que, ironicamente, parece deixar entrever apenas como paisagem disponível uma espiral infinita de brumosa letargia, sento-me no meu banco meditativo, exaurida. Concordo com as minhas compinchas, que há que criar um blog e partilhar convosco toda esta perturbadora aventura de existirmos em crise. Oh, mas não é crítica toda a História do Ser??...Bom. Sim, um blog. Temos de estar juntos, é necessário estarmos próximos. Novos amigos, futuros melhores amigos, olá. Que bons voos façam connosco acima deste ninho, e que se esboce aqui, no recato deste espaço pensante, a panaceia para os males da Nação, e direi mais, do Cosmos!

Na treva sombria de todos os inumeráveis males que podemos disciplinadamente contabilizar, ocorre-me um que não será, por certo, dos menores. Foi há muito pouco tempo que, confesso, tomei contacto com esta realidade que muitos e, sobretudo, muitas de Vós tão bem conhecerão. Mas eu ignorava. E, como todos os ignorantes, era dona de uma Felicidade intocada e cuja mutação foi, desde o momento definitivo a que me refiro, irreversível. Sei que anseiam detalhes. E a mim cabe-me detalhar com (des)gosto. O que se passou foi o seguinte:

O Verão aproxima-se a passos largos, como é sabido, apesar das birrinhas intermitentes da nossa dilecta Prima Veríssima. Como um todo vivo e em mudança, o nosso organismo segrega, incha, desincha, estala, move-se, lava-se, tolhe-se, as unhas cortam-se, algumas borbulhas tomam, faceiras, o cândido território da nossa cútis, as remelas espreitam pelas manhãs e ….os pêlos crescem. Lembrei-me então (Oh ledo, amargo engano), de adquirir uns boioezinhos de cera, dita tépida, a fim de me lançar, numa timidez virginal e iniciática, nos meandros da depilação rigorosa, sofisticada, duradoura, senhoril. Sim, senhoril, uma instalação confortável nos meandros femininos, com a suave confiança de que os meus pêlos seriam admoestados, e de que todo um novo universo, na verdade um pluriverso de revelações e sensações se abriria para mim. Preparativos semi-extasiados entre a cozinha e a casa de banho, boião no microondas, leitura académica das instruções. Meta o pauzinho e rode que se estiver quente há-de aparecer “NO!” Hum. Foi bem verdade. Quente qb, fui dando à espatulazinha para controlar a temperatura do milagroso preparado. Mas então nunca mais? Claro que, sendo curta, a espátula rapidamente se encheu de cera e, por arrastamento, também os meus dedos. Dedos bezuntados, pauzinho lentificado na espessura febril da cera, toda a inenarrável nhanha a conquistar polegadas sucessivas do boião, do móvel, do chão, os dedos colados à espátula, escarranchados na caixinha, colados entre si como se devorados por um Pega-Monstro feroz, e o desconforto a subir dos pés à cabeça. A apelar à calma e a uma réstea de concentração, lá testei a temperatura da misturaça com a pontinha do mindinho. Nada do “NO” se transformar em “Yes” ou, pelo menos, desaparecer. Mas que importava? Parecia já morna aquela massa informe cor de mel. E até levemente perfumada. Ora, há que ter alguma perseverança no meio destas situações quotidianas, nem tudo é fácil na vida…Proceda-se à aplicação, esperando que a temperatura não me aumentasse ainda mais os derrames já existentes. Recomendada uma camada bem fininha de cera sobre as perninhas, lá iniciei, com a sensualidade de um escultor a intimizar-se com o seu cinzel, todo o processo de espalhar a cera com a espátula, naturalmente (eh bien, não haja equívocos) no sentido do crescimento do pêlo. Tentei, não sem algum estoicismo, arredar a vozinha cretina que me soprava, sibilina… “Com tanta cola junta, há-de ser no sentido contrário, no mesmíssimo sentido, e até a pique que essa m…iscelânea se há-de para aí alapar”. Espalhei, apus a reconfortante faixa branquinha, pressionei com a firmeza e a audácia dos crentes. Ai que medo, isto deve doer tanto!, arrisquei pensar. Respirar fundo….Deditos preparados no final da faixa…Depois da tempestade vem a bonança, o que arde cura o que aperta segura, não há mal que nunca se acabe…Enfim, toda uma sucessão de verdades intemporais ecoava sem cessar, numa tentativa de encorajamento realmente comovedora. E….zássssssssssssssssssssssssssssssssssssssss! Não doeu quase nada, a bem da verdade. Também a bem da mesma verdade, vi realmente manchas isentas de pilosidade e vários oásis de pêlos resistentes entre as ditas. Nada de desiludir. Nova aposição das faixa…Nem consigo imaginar se, no meio das repetições da pegajice sobre a pele mais algum pêlo saiu, se tudo era já uma ilusão de óptica auxiliada pela sujeira da cera e das faixas amarrotadas. Ok, fiquemos pela meia perna. Isto com o tempo e com a experiência vai lá, e só tenho de emendar o resultado com gillete. Onde deve mesmo valer a pena é nas axilas e nas virilhas. E a este passo, posso dizer, a minha mundividência conheceu uma transformação efectiva. Cera colocada, banda necessariamente toda torta a procurar abranger as sinuosidades e concavidades axilares…Respirar fundo, muito fundo e…..zásssssssssssssssssssssssssss. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Olho: picos de sangue em vários sítios da axila, e uma dor…Uma dooooooooooor! O arranque inicial e o desconforto subsequente…Engoli em seco, mudei de cor, aferi do resultado: manchas de pêlos e manchas branquíssimas, limpas, lindas. Completamente descoroçoada e já desprovida da totalidade de equilíbrio emocional, passei à axila seguinte, porque neste caso era essencial passar por esta provação em par. Combalida, dorida, revoltada e tomada de uma ira à beira da perigosidade máxima, agarrei-me às bandas usadas e às bandas sobejantes, à caixinha e à espátula e enfiei tudo num saco de plástico definitivo, num horror definitivo: fora! É para isto? Para os pêlos não saírem, para me aleijar estupidamente, para encontrar este desapontamento no fim da linha, para um gasto imponderado de dinheiro que tanto custa a ganhar? Antes peluda, antes felpuda, antes rapar-me, raspar-me diariamente! E nunca as gilletes me pareceram tão modernas, tão poderosas, tão simpáticas e macias. Desculpem mas, depois desta experiência, uma pessoa não pode ser igual.

Meditabunda